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Dra Thaís Villa é médica neurologista especialista no diagnóstico e tratamento da enxaqueca

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Enxaqueca e ambiente corporativo: o mal invisível que exige atenção

Dra Thaís Villa é médica neurologista especialista no diagnóstico e tratamento da enxaqueca

Colaboração Dra. Thaís Villa

Executivos em cargos de alta gestão — como CEOs, CFOs e COOs — enfrentam diariamente uma rotina intensa, marcada por pressão constante, prazos apertados, decisões estratégicas de grande impacto e uma agenda repleta de compromissos. Embora esse ambiente desafiador faça parte do universo C-level, pode impor um custo elevado à saúde física e mental desses profissionais. Entre tantos desafios enfrentados, um pode se destacar pela frequência, gravidade e invisibilidade: a enxaqueca. Para os executivos que sofrem da doença, o acúmulo de responsabilidades pode deixar de ser apenas exaustivo — e se tornar verdadeiramente incapacitante.

Estudos médicos já demonstraram de forma ampla a forte relação entre estresse e enxaqueca. O estresse é um dos principais gatilhos da condição, especialmente em cérebros predispostos, como é o caso de pacientes com enxaqueca crônica. A hiperexcitabilidade do cérebro dessas pessoas pode tornar o ambiente corporativo hostil ao bem-estar. Sintomas como dores de cabeça intensas, sensibilidade à luz e ao som, náuseas, tontura, formigamentos, taquicardia e alterações de humor podem ser agravados pelas exigências do dia a dia profissional, comprometendo não só a performance no trabalho, mas também a qualidade de vida.

Quando estamos sob tensão, nosso corpo libera hormônios como o cortisol e a adrenalina, que provocam alterações no sistema nervoso central e podem desencadear ou intensificar uma crise. Para a sensação de alívio da dor, infelizmente, o uso indiscriminado de analgésicos e anti-inflamatórios — prática comum entre profissionais que não podem se “dar ao luxo” de parar — contribui para o chamado “efeito rebote”, intensificando os sintomas e cronificando a doença.

O ciclo vicioso do estresse, sono ruim, má alimentação e uso excessivo de medicamentos faz com que a enxaqueca se torne cada vez mais presente e difícil de controlar, resultando no aumento de casos de ansiedade, depressão, déficit de atenção, e, em situações mais graves, risco aumentado de AVC e infarto.

A enxaqueca é um problema tão grave que seus efeitos vão além da saúde. Segundo o estudo “Impacto socioeconômico das principais doenças em oito países da América Latina”, o Brasil perde anualmente cerca de R$ 168 bilhões, o equivalente a 1,6% do PIB, em função da enxaqueca. A condição afeta as pessoas na fase mais produtiva da vida, entre 20 e 59 anos, e é considerada a principal causa de incapacidade no mundo. Em ambientes corporativos, isso se traduz em perda de produtividade, aumento de afastamentos e dificuldade de retenção de talentos.

Apesar da gravidade da doença, ainda há muito desconhecimento sobre o diagnóstico correto. É comum que a enxaqueca seja confundida com sinusite, tensão muscular ou até mesmo TDAH, o que atrasa o início de um tratamento adequado, prolongando o sofrimento. O diagnóstico preciso, feito por neurologistas especializados, é fundamental para romper esse ciclo.

O tratamento ideal não se limita a prescrever medicamentos pontuais. A enxaqueca exige uma abordagem multidisciplinar e integrada: o chamado Tratamento 360º. A estratégia considera o paciente como um todo e envolve profissionais de Neurologia, Nutrição, Odontologia, Fisioterapia, Psicologia, Gastroenterologia e outras especialidades. Além disso, recursos modernos, como o uso de toxina botulínica (botox) e anticorpos monoclonais anti-CGRP, têm se mostrado altamente eficazes no controle da doença.

Mais do que aliviar a dor, o Tratamento 360º busca devolver qualidade de vida aos pacientes. Especialmente para as mulheres — mais propensas a desenvolver formas severas de enxaqueca —, essa abordagem representa uma mudança de vida. É urgente que a sociedade passe a olhar a enxaqueca com a seriedade que ela merece. Não se trata de uma simples dor de cabeça, mas de uma condição neurológica complexa, debilitante e, muitas vezes, invisível.

Enfrentar a doença é possível com acesso a diagnósticos precisos e tratamentos eficazes. É hora de abandonar a banalização da dor e adotar uma postura ativa pela saúde, sem dores e por uma vida mais plena — como ela deve ser.