O exercício da religião sob a tutela da dignidade da pessoa humana
Por Dr. Nei Calderon
O exercício da religião e da fé envolve a busca pela satisfação e pela realização pessoal, aspectos que colaboram com a pacificação da sociedade — desde que considere a fé pela fé, e não a concorrência ou a competição pelo predomínio entre diferentes religiões. Deve ser considerado como valor a ser juridicamente tutelado, abarcado pelo princípio da dignidade humana, e assim como pela liberdade de manifestação do pensamento e de expressão, corolários necessários para o exercício da liberdade religiosa. Liberdade de manifestação do pensamento e de expressão são conceitos inerentes a uma sociedade que se pretenda democrática. No entanto, essas liberdades não podem ser suscitadas para a propagação de discursos de ódio, em especial em face da religião adotada por outrem. A liberdade religiosa deve ser tutelada no âmbito da dignidade da pessoa humana, assim como devem ser reprimidas as condutas praticadas com suposto fundamento na fé, mas que resultem na prática de atos lesivos à sociedade, posto que ilegítimas. Nesse aspecto, a liberdade religiosa não pode ser suscitada para justificar a tolerância a atos terroristas praticados ao amparo da interpretação dos preceitos de determinada religião, posto que em tal situação estariam ausentes a responsabilidade e a função social. A liberdade religiosa deve ser compreendida como direito fundamental, inerente a todos e a cada um, a ser respeitado sobretudo por força do princípio da dignidade da pessoa humana. Aceitar o outro e (re)conhecer as diferenças é o que torna e afirma as pessoas como seres humanos únicos e amplos. O não familiar, o estranho, tem o poder de ampliar a visão, transformar as ações e moldar a interação entre as pessoas. O mundo individual existe apenas diante do contraste com o mundo do outro. A fé, além de integrar um direito social subjetivo, é um elemento de alto valor e impacto social, que deve ser tutelado e não julgado, criticado e depreciado. Não se trata, por fim, de defesa de determinada religião, mas sim de todas as religiões que respeitem princípios e valores humanos, consagrados dentro de uma perspectiva histórica. Portanto, a religião e a fé, quando exercidas com responsabilidade social, têm função social relevante, devendo a liberdade religiosa ser juridicamente tutelada ao amparo do princípio da dignidade da pessoa humana, servindo para criar condições para a construção de um mundo mais justo, mais humano e mais humanizado.