Alexandre Pinto, CEO da Le Creuset para a América Latina, está muito otimista à frente dos negócios
Por Walterson Sardenberg Sº
Retratos Germano Lüders
Uma panela pode ser um artigo de luxo. Na realidade, ela é um artigo de alto luxo. No caso específico, claro, das fabricadas pela tradicional empresa francesa Le Creuset. Cada Le Creuset é uma peça única, produzida em ferro fundido com zelo artesanal. vem sendo assim há um século, e sempre com a mesma qualidade. “Que outro produto dá a garantia de 100 anos?”, pergunta, enfático, o paulistano Alexandre Pinto.
Ele é, desde 2022, o CEO da Le Creuset para a América Latina, comandando as operações do Brasil. México, Chile e Colômbia. Um adendo: embora seja um executivo experiente, com longas vivências no ramo de edição de livros e na área farmacêutica, Alexandre Pinto tem apenas 46 anos – e muita energia para trabalhar.
Instalado em um amplo escritório à margem do renovado Rio Pinheiros, em São Paulo, ele faz do otimismo uma profissão de fé. Não é para menos, pois lidera uma empresa que possui 18 mil produtos em catálogo. Embora as panelas sejam o carro-chefe da marca, a Le Creuset oferece uma ampla gama de itens desejados pelos amantes da gastronomia.
Simpático e envolvente, Alexandre Pinto, corintiano de carteirinha e pai de um rapaz de 18 anos e de uma garota de 3, transpira, de fato, otimismo. Entre seus hobbies, destaca-se sua paixão por tocar música eletrônica. Um gosto que compartilha com o filho. O ritmo frenético combina bem com a sua atuação como executivo.
THE PRESIDENT _ Conte um pouco da sua trajetória.
Alexandre Pinto – Comecei a trabalhar com 17 anos na importadora da minha mãe e de minhas irmãs. Elas traziam artigos de papelaria. Isso foi em 1994, logo que entrei na faculdade de administração de empresas, no Instituto Presbiteriano Mackenzie, em São Paulo. Eu fazia de tudo na importadora, desde empacotar até distribuir os produtos pessoalmente. Uma curiosidade: dois anos depois, conseguimos a representação da Le Creuset no Brasil. Na época, a marca já era consolidada no mundo da gastronomia, mas ainda desconhecida por aqui. Só um ano mais tarde, ela montou a própria subsidiária no Brasil. Mas não me envolvi nessa história. Só minhas irmãs.
A importadora seguiu adiante?
Seguiu até 2000, quando houve uma crise cambial muito forte. A empresa quase quebrou. Ainda bem que conseguimos pagar as dívidas e fechá-la. Não foi nada fácil. No entanto, descobri que importar livros era uma atividade isenta de impostos. Então, decidi trazer para o Brasil um livro da renomada fotógrafa australiana Anne Geddes, chamado Os Meus Primeiros Cinco Anos, com fotos de crianças. O livro teve ótimas vendas. A partir dali, fundei a editora Alles Books e permaneci no setor editorial por 13 anos, publicando cerca de 100 títulos. Meu maior sucesso foi a biografia de Nelson Mandela, um lançamento do qual tenho muito orgulho. Nesse período, morei algum tempo em Barcelona. Depois de oito meses por lá, o empresário Fernando Marques, dono da União Química, me convidou para voltar ao Brasil para trabalhar na divisão gráfica da empresa. É hoje um dos maiores laboratórios brasileiros.
Deixar a linda Barcelona não deve ter sido fácil.
Mas compensou, e muito. Fiquei 15 anos trabalhando com o Fernando Marques, que é o CEO da empresa e maior empreendedor que conheci. Comecei como coordenador da área gráfica, passei para a divisão de compras e depois para o planejamento de produção e a logística. Saí como diretor estatutário de supply chain. Uma das minhas irmãs havia continuado na Le Creuset, atuando como diretora da empresa nos Estados Unidos, China e Japão. Hoje ela faz parte do board na Europa e me apresentou ao Paul Van Zuydam, o dono da Le Creuset. Ele é uma pessoa incrível, um exemplo a ser seguido. Logo depois que me desliguei da União Química, Paul me fez o convite para trabalhar na companhia. Quando conheci melhor os produtos, me acendeu uma luz.
Por quê?
Percebi que haveria um mar de oportunidades no Brasil para as melhores panelas do mundo. O Paul me contratou com o mesmo cargo que eu tinha na União, diretor de supply chain para a América do Sul. Eu cuidaria de Brasil, Chile e Colômbia. Pedi para inserir a área de recursos humanos no meu escopo. Peguei tudo o que tinha aprendido ao longo da minha trajetória como empreendedor e na indústria farmacêutica e apliquei na Le Creuset. Seis meses depois, o Paul me convidou para ser o CEO América Latina.
Quais resultados você conseguiu nesses seis meses para surgir um convite tão generoso?
Era uma empresa com muitas questões de atendimento a serem melhoradas, quer dizer, uma equipe que precisava ser treinada. O que me incomodava – e muito! – era a África do Sul estar na frente do Brasil em faturamento. Sim, a empresa tem um time fantástico por lá. Mas, poxa vida, nada justificava a gente ser menor que a África do Sul em faturamento. Eles têm 60 milhões de habitantes, e o Brasil, 220 milhões. Estávamos com uns 7% de desemprego. Eles, com 40%. A expectativa de vida aqui é de 75 anos. Lá 60. Falei: “Temos que montar um time totalmente inconformado. Não podemos aceitar essa situação”. Resultado: logo no primeiro ano, crescemos 38%.
Como fazer para divulgar o nome de um produto então pouco conhecido e muito mais caro que o dos concorrentes?
Um produto Le Creuset apresenta benefícios claros. A começar por ter 100 anos de garantia. Que produto hoje você tem com 100 anos de garantia? Além do desempenho ímpar, é livre de contaminação por metais pesados. O único ponto é o cuidado na utilização, a panela não pode sofrer choque térmico (sair do fogo e jogar água fria). Se utilizada corretamente, é herança por gerações. E dura gerações!
Ainda assim é um produto para pouquíssimos.
Nada disso. Falavam que o público da Le Creuset é AAA. Não é. O nosso público é o amante de gastronomia. Simples assim. Qualquer pessoa que ame gastronomia é um potencial consumidor. A questão do preço é relativa. Hoje, quando analisamos o mercado de luxo, qualquer item custa mais que 20, 30 mil reais. Uma panela tem seu preço de entrada por volta de 1,3 mil reais. O preço de uma panela hoje custa quase o mesmo que um bom tênis de corrida. Nosso objetivo é que o consumidor compre seu primeiro item, pois terá uma experiência completa, com qualidade, harmonia e design. Se você fizer a conta por ano de utilização, não tem comparação.
Há pessoas de classe média que compram Le Creuset?
Muitas. Como disse, basta você ser um verdadeiro amante de culinária.
Como é feito o marketing?
Décadas atrás, os divulgadores da marca no Brasil eram os grandes chefs. Principalmente os franceses, como o Laurent Suaudeau e o Emmanuel Bassoleil, e eles foram fundamentais para a construção da marca. Chancelavam, espontaneamente, a qualidade do produto. Fundamentais na construção da marca. Mas a nova geração mudou, e olhamos para quem sabe se comunicar nos novos formatos. Quando olhamos os grandes chefs cozinhando, temos a impressão que jamais conseguiremos cozinhar como eles. Já os novos chefs influenciadores se parecem mais com o público-alvo, e isso cria maior conexão. Também abrimos frentes nas áreas de moda, decoração e design. Porque uma Le Creuset é um produto que também funciona como objeto de decoração. Um dos grandes trabalhos do time de marketing foi: “Abrir o leque de influências na comunicação”.
Fora a aura de um produto chique e tradicional, usado por grandes chefs, no que tecnicamente ele é melhor que os demais?
Além da sua qualidade, durabilidade e design sofisticado, as panelas da Le creuset são fabricadas com ferro fundido vitrificado, num rigoroso processo artesanal. O ferro fundido permite uma distribuição uniforme do calor, garantindo cozimento homogêneo. O revestimento de esmalte vitirificado evita absorção de odores e sabores, permitindo que os alimentos mantenham suas características. O acabamento vitrificado evita reações químicas entre os alimentos e o metal, tornando a panela segura para a saúde.As panelas podem ser utilizadas em todos os tipos de fogão, incluindo indução, elétrico, a gás e vitrocerâmico. São compatíveis com o forno, permitindo preparos que exigem finalização em alta temperatura. O ferro fundido mantém o calor por mais tempo, resultando em uma cocção mais eficiente e economia de energia. A retenção de calor permite que os pratos sejam servidos à mesa ainda quentes, sem a necessidade de reaquecimento imediato. Além de ter cores vibrantes. O design clássico e atemporal agrega elegância e valor estético, transformando a panela em um item decorativo. A vitrificação e o degradê são a fórmula secreta da Le Creuset.
“Um produto Le Creuset apresenta benefícios claros. A começar por ter 100 anos de garantia”
As lojas no Brasil são próprias ou franquias?
Próprias. Estamos com 14. Pode parecer pouco, mas não é. Globalmente, a Le Creuset tem 601 lojas, todas próprias. Qual é o melhor número que eu posso apresentar hoje? Quando entramos, no dia 1º de janeiro de 2022, a Le Creuset Brasil ocupava a 17ª posição no ranking global da companhia, que tem 40 subsidiárias.
Com a África do Sul lá na frente…
Sim. Hoje estamos em sexto lugar, empatados tecnicamente com o quinto e o quarto. É uma conquista. Estamos atrás apenas de Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Japão e Canadá. O Brasil tem um papel muito relevante no avanço da companhia. É uma questão de trabalho, de meta. Um dos objetivos é abrirmos duas ou três lojas este ano, que afinal é o ano de centenário da Le Creuset.
Em tese, o produto é o mesmo há 100 anos. Como trabalhar esse dado em um mercado de luxo, sempre ávido por novidades?
De fato, eu não troco de coleção. Meu produto é sempre o mesmo. Não existe Le Creuset de verão e Le Creuset de inverno. Mas há uma variação maior de cores. Além disso, sempre trazemos novidades. A empresa tem hoje 18 mil produtos no portfólio, no catálogo. São 1,6 mil aqui, no Brasil. São potes, xícaras, moedores, pratos, jarras, linha de panelas TNS, 3PLY. Uma infinidade.
Quanto de cada produto é artesanal?
Na produção da linha de ferro na França, cada produto passa na mão de cerca de 15 artesãos durante todo o processo. O molde de cada panela é único. Ele é quebrado depois do processo de produção. O transporte do metal derretido é feito de forma manual, em um carrinho. O funcionário joga dentro de um tambor, transfere para máquina e aí começa o processo. Em todas as etapas, há uma inserção manual. Nenhum concorrente trabalha assim.
Quais são os novos desafios?
Entre eles, aumentar o faturamento no México. Em tese, trata-se de um mercado do tamanho do brasileiro. Até porque é um país que também ama a gastronomia. Mas ainda não funciona assim. Hoje o Brasil representa 80% do faturamento na América Latina. Outro trabalho é cada vez mais mostrar que nosso produto é um presente perfeito.
Como assim?
Entre outros atributos, fabricamos produtos que as pessoas adoram receber como presente. Suponha que você queira presentear alguém de que gosta muito, entre em uma loja de grife em um shopping center e compre uma camiseta. Você vai pagar por ela 300 reais. Qual é a possibilidade dessa pessoa querer trocar a camiseta? Imensa. Ou quer outro tamanho, não gostou da cor ou do desenho. Com o mesmo valor, você pode comprar duas xícaras Le Creuset. Acredite: essa pessoa vai adorar e ficará muito impactada. E não vai querer trocar.
Deve funcionar ainda melhor para presentes maiores. De casamento, por exemplo.
Exatamente. Pode ser uma panela de entrada, uma travessa. Se você deixar uma panela Le Creuset no seu fogão, ela vira objeto de decoração. Ainda mais nesses tempos em que os arquitetos projetam salas e cozinhas conjugadas. Você começa com uma panela laranja, que é a tradicional. Aí descobre que combinará com outra, verde. A Le Creuset, enfim, tem muitos argumentos de venda. Até mesmo o fato de que une as pessoas. Elas precisam se juntar para uma boa refeição e para celebrar. Melhor ainda com panelas bonitas e com um funcionamento perfeito!
Qual é o seu público potencial no Brasil?
Vamos fazer uma conta básica. Dos 220 milhões de brasileiros, cerca de 10% podem comprar uma panela Le Creuset. São mais de
20 milhões de pessoas. Se eu conseguir vender para um quarto delas, serão 5 milhões de panelas de ferro fundido Le Creuset. Quer dizer, eu viro CEO da
Le Creuset global. (risos) O potencial é imenso.
Você cozinha?
Só sei fazer risoto. Modéstia à parte, faço muito bem. Em uma risoteira Le Creuset, claro.
Aos 46 anos, ainda bem jovem, você tem um cargo de destaque em uma companhia internacional sólida, que fabrica produtos de alta qualidade.
Não dá para reclamar. Costumo dizer que Deus me deu a oportunidade de trabalhar em três áreas fundamentais para o ser humano. Trabalhei com educação, editando livros. Foi muito legal ter participado de bienais do livro, ter publicado o livro sobre o Mandela. Depois fui para a indústria farmacêutica, em que vendemos saúde. Você vende bem-estar. Por fim, entrei em uma área intimamente ligada à alimentação, com produtos que são inegavelmente de alta qualidade.