Fernando Gorayeb, CEO da Ballena, explica como pesquisa e percepção orientam cada decisão na criação de novos rótulos
Por Redação
Fotos Divulgação/Fernando Gorayeb
Há quem entre no mercado de bebidas por oportunidade. E há quem entre por fascínio. No caso de Fernando Gorayeb, CEO da Ballena, o ponto de partida foi o encantamento genuíno por aquilo que circula entre pessoas: o ritual do encontro. A porta se abriu quando o empresário trouxe ao Brasil a Fever-Tree e, a partir dali, começou a criar seus próprios rótulos, não como exercício de branding, mas como extensão de um olhar atento para o consumo.
“Se o seu produto for apenas mais um entre tantos, nenhuma estratégia vai sustentá-lo.”, ditado este que resume seu método: viajar, observar, perceber o que está latente e traduzir isso em produtos com atmosfera própria. Autenticidade antes de tendência. Estratégia antes de expansão.
No comando de um pool de marcas que segue crescendo, Gorayeb equilibra criação, posicionamento e gestão com uma combinação rara: visão de longo prazo e tato para o presente. Em entrevista à THE PRESIDENT o empresário revisita o início de sua carreira, aprendizados que moldam seu processo e o movimento de levar a Ballena para um mercado mais competitivo.
THE PRESIDENT _ Como surgiu seu interesse pelo universo das bebidas e o que motivou seus primeiros empreendimentos?
Fernando Gorayeb – Meu interesse pelo mercado de bebidas surgiu porque sempre fui um apreciador. Sou aquele cara que, quando chega em um restaurante, bar ou hotel, sempre pede uma recomendação, pergunta qual é o drink da casa, tenta experimentar algo novo. Acho que isso sempre me seduziu. Trabalhar com um bem de consumo como alimento e bebida é muito legal, porque você vê aquilo acontecer na prática. Você vê o seu produto na gôndola, vê as pessoas tomando, vê a garrafa circulando de um lado para o outro. Isso é algo muito sedutor, porque traz uma sensação concreta de realização.
A minha grande entrada nesse mercado foi com a importação da Fever-Tree, uma marca inglesa de mixers que continua sendo líder na categoria premium. Há cerca de dez anos, tive a oportunidade de importar e desenvolver essa marca com exclusividade no Brasil, e isso me proporcionou um acesso e um conhecimento enorme sobre o mercado nacional. É uma marca muito notória, que hoje vale cerca de dois bilhões de libras na bolsa de Londres. Na época, todas as grandes indústrias queriam fazer parceria comigo, então acabei aprendendo muito rápido. E, a partir do primeiro produto que desenvolvi; não o da marca, mas o primeiro que criei por conta própria; comecei a empreender e a desenvolver os meus próprios rótulos. Acho que esse foi meu grande primeiro passo e minha principal motivação dentro do mercado de bebidas.
Como você identifica tendências antes de lançar um novo produto?
FG – Identificar tendências é quase como aquela pergunta sobre o que veio primeiro, o ovo ou a galinha. É um conceito complexo, porque envolve várias camadas. Com experiência de mercado, você percebe que uma das coisas mais importantes, especialmente no setor de bebidas, é ter a possibilidade de viajar e conhecer outras culturas. Isso enriquece muito o conhecimento sobre a forma como as pessoas consomem, sobre o que está acontecendo e, principalmente, sobre o que vai acontecer. Esse olhar global ajuda muito a aplicar ideias na criação de novos produtos. Mas isso é apenas uma parte do processo. Se você apenas seguir tendências, acaba criando algo igual ao que todo mundo faz. E aí, perde autenticidade. Então, é fundamental conhecer o mercado, estar sempre antenado, viajar, observar outras realidades, entender o que está acontecendo não só no Brasil, mas no mundo, e a partir daí, aplicar esse repertório de uma forma que não se distancie tanto do presente, mas também aponte para o futuro.
Como gerenciar marcas diferentes ao mesmo tempo?
FG – Gerenciar várias marcas ao mesmo tempo é um desafio, mas hoje eu tenho o lado positivo de contar com uma equipe competente, em quem confio, e à qual posso dar autonomia. Isso nos permite alcançar nossas metas e objetivos com clareza. Eu acredito muito que ninguém constrói nada sozinho. É essencial saber identificar onde você desenvolve algo com excelência e onde precisa de ajuda. Nesse ponto, entra também a importância dos meus sócios, tenho parceiros diferentes em algumas marcas, que me auxiliam tanto no dia a dia quanto na gestão. Ter uma equipe sólida e sócios comprometidos permite que a gente mantenha um pool de marcas saudável, com atenção e foco em cada uma delas. Isso garante que nenhuma fique esquecida e todas possam se desenvolver de acordo com seus próprios objetivos.
Quais os maiores desafios da expansão da Ballena para os EUA?
FG – Os maiores desafios da expansão da Ballena para os Estados Unidos estão relacionados ao fato de o mercado americano ser muito mais hostil do que o brasileiro. Aqui no Brasil, é possível ter um crescimento orgânico, mais natural, que não depende de grandes investimentos de capital. Já nos Estados Unidos, existe uma enorme disponibilidade de capital esperando boas ideias: o que significa que a concorrência é muito maior e mais agressiva. O primeiro grande desafio, portanto, é entrar estruturado no mercado americano. Embora ele seja cerca de dez vezes maior que o brasileiro, é também mais competitivo. É preciso ter uma estratégia muito bem definida, entender que não é necessário estar em todos os estados, mas sim nos mercados certos, e contar com um parceiro local realmente comprometido com o desenvolvimento da marca.
Outro ponto importante é entender qual será a adaptação ou “tropicalização”, como costumamos dizer quando trazemos algo para o Brasil, da marca para esse novo público. É necessário ajustar produto, estratégia, consumo e comunicação ao perfil americano. O mercado dos EUA é dinâmico e depende de investimento constante para se atingir os objetivos. Em resumo: é fundamental entrar com um bom aporte de capital, uma estratégia clara e uma adaptação bem feita para ter sucesso lá fora.
Como você define o posicionamento das suas marcas no mercado?
FG – O posicionamento nasce do objetivo principal da marca. Quando você cria uma marca, define o seu storytelling, a sua atmosfera, a persona ideal do consumidor e o universo que ela vai habitar. É isso que determina o posicionamento desejado no mercado. Esse processo é uma mistura entre o que você quer e o que você consegue. Você visualiza onde quer chegar, trabalha intensamente, faz experiências, ativações, investe em marketing, em posicionamento e tenta alcançar aquele ponto que imaginou. Mas o mercado é dinâmico, e o consumidor muda. Então, mesmo que o posicionamento seja definido no “Dia 1” com o público, o preço, o produto, o tom da comunicação e a proposta de valor, é inevitável fazer ajustes ao longo do tempo. A partir do feedback do mercado, você vai manobrando e ajustando a estratégia para chegar o mais perto possível do objetivo inicial. É um processo vivo, em constante evolução, mas que precisa sempre respeitar a essência da marca.
Quais estratégias você usa para diferenciar suas marcas em um mercado competitivo?
FG – Acho que as estratégias que usamos são, em grande parte, os nossos próprios diferenciais. Quando você lança um produto, ele precisa ter algo único, não pode ser mais do mesmo. Não precisa de mil diferenciais, mas um grande diferencial já é suficiente para servir como o alicerce de toda a estratégia. Todas as nossas marcas têm algo que as diferencia. A partir disso, criamos experiências, vínculos afetivos, comunidades, hype e tendências ao redor delas. Quando um produto é apenas mais um entre tantos, por mais que a estratégia seja boa, ela não tem legitimidade. O que sustenta uma boa estratégia é a autenticidade. Então, em resumo: tenha um diferencial real e construa todo o ecossistema da marca (experiências, ativações, comunidade) em torno dele. É isso que gera valor e diferenciação verdadeira.
Que conselho você daria a quem quer empreender no setor de bebidas?
FG – Se eu pudesse dar um conselho a quem quer empreender no setor de bebidas, eu diria algo que sempre repito: se você tem uma ideia na qual acredita tanto a ponto de vender tudo o que tem para apostar nela, mesmo sabendo que pode ficar sem nada no mês seguinte, então invista. Porque isso é empreender. Empreender é acreditar de verdade, mesmo quando o cenário não é favorável. Mas é importante também entender que você não faz nada sozinho. Isso não significa se associar a qualquer pessoa, muito pelo contrário. É essencial identificar onde você tem excelência, onde precisa de apoio e se cercar de pessoas certas, com caráter, ética e o mesmo propósito que você. Negócios sólidos se constroem com boas ideias, mas só prosperam com boas pessoas.