Júlia Soares, Gabriel Bortoleto e João Fonseca despontam como promessas que colocam em jogo mais que o desempenho esportivo: a capacidade de se tornarem bons cases para as marcas
Por Marcos Diego Nogueira
O Brasil sempre teve uma relação intensa com seus ídolos esportivos. Nomes como Pelé, Ayrton Senna, Maria Esther Bueno, Eder Jofre, Gustavo Kuerten, Daiane dos Santos e Rebeca Andrade não apenas venceram, mas se tornaram símbolos de superação, talento e identidade nacional. Hoje, uma nova geração surge no horizonte, carregando expectativas e a esperança de reacender a paixão por modalidades que, fora do futebol, ficam muitas vezes à sombra.
Gabriel Bortoleto, João Fonseca e Júlia Soares são os nomes da vez. Vejamos: um piloto que chega à Fórmula 1 após anos sem representação brasileira fixa no grid; um tenista que ascende com rara rapidez, despertando comparações precoces com Kuerten; e uma ginasta que tenta consolidar seu espaço em um esporte que já tem sua principal estrela, Rebeca Andrade. Mas será que eles podem, de fato, herdar o legado dos grandes ídolos? E como o marketing esportivo enxerga esses três talentos?
Para Eduardo Corch, consultor de marketing e professor do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), comparações são delicadas. “Avanços em fisiologia, nutrição e equipamentos esportivos mudaram o cenário competitivo. Eles são talentos promissores, mas ainda é cedo para colocá-los ao lado de lendas”, pondera. Ubiratan Leal, comentarista da ESPN, reforça: “A importância desses atletas de esportes diferentes, que se mostram muito competitivos, é fazer o brasileiro lembrar que nem tudo é futebol. Eles são fundamentais para fazer as pessoas consumirem, lembrarem e começarem ou voltarem a praticar esses esportes.”
Em termos de marketing esportivo, o cenário é mais complexo do que o vivido pelos “heróis” do passado: atletas disputam atenção não só entre si, mas com influenciadores digitais e criadores de conteúdo. Lembrando que a premiação no esporte varia consideravelmente entre modalidades: no tênis, onde há uma melhor premiação direta em torneios individuais, um campeão individual de Grand Slam embolsa entre US$ 2,5 milhões e US$ 3,5 milhões de dólares. Já no automobilismo, a renda é elevada via contratos, e um piloto como Verstappen, Leclerc ou Hamilton tem um salário entre US$ 25 milhões e US$ 55 milhões ao ano. Na ginástica, infelizmente, a premiação é modesta e o foco está em incentivos governamentais e no apoio de marcas — bem como uma medalha de ouro olímpica rende aos ginastas entre US$ 25 mil e US$ 50 mil pelo COI (Comitê Olímpico Internacional).
Do lado das empresas, as que apoiam oficialmente esportistas olímpicos podem receber incentivos fiscais no Brasil, principalmente por meio da Lei de Incentivo ao Esporte (Lei n.11.438/2006 e alterações posteriores, como Lei n. 13.756/2018).
Corch comenta: “No ponto de vista de marketing, um atleta se torna ‘realidade’ quando deixa de ser apenas um resultado esportivo e passa a ser um ativo de comunicação — capaz de gerar conexão, engajamento e influência positiva, mesmo nos altos e baixos da carreira”.
Para Ubiratan Leal, as redes sociais podem ser vistas também como um diferencial positivo para o atleta da nova geração: “Se por um lado isso traz concorrência, por outro lhe dá mais ferramentas para você eventualmente trabalhar e se destacar. Mesmo na hora que o resultado não está vindo ou você está contundido, se tem uma rede social bem trabalhada consegue atrair um bom grupo de seguidores e bons patrocínios”.
João Fonseca: o fenômeno do tênis em construção
Patrocinadores: XP Investimentos, On Tênis, Rolex e Yonex
Instagram: 1 milhão de seguidores
Aos 17 anos, João Fonseca já é tratado como a maior aposta do tênis brasileiro desde Gustavo Kuerten. Sua ascensão meteórica – com títulos juvenis de Grand Slam e rápida adaptação ao circuito profissional – chamou a atenção não só de fãs, mas do mercado. “João se destaca por seu perfil: um jovem centrado, trilíngue, com maturidade emocional rara para sua idade”, analisa Eduardo Corch.
Apoiado no momento pela XP Investimentos, a Rolex, a empresa japonesa Yonex Tennis e a de artigos esportivos On, seu potencial mercadológico vai além das quadras. Filho de uma família de posses, educado em colégio tradicional do Rio de Janeiro e com discurso articulado, Fonseca é visto como uma figura “segura” para marcas que buscam alinhar performance com valores. “Muita gente acha que ele tem potencial para ser um dos primeiros do ranking mundial, ficar brigando por muitos títulos e ganhar Grand Slam”, complementa Ubiratan Leal.
O desafio, agora, é transformar o hype em consistência. Se conseguir, pode ser o responsável por reacender no Brasil o amor pelo tênis – assim como Guga fez nos anos 1990.
Gabriel Bortoleto: reabrindo as portas da F1
Equipe Stake F1 Team Kick Sauber
Patrocinadores: Banco BRB, KitKat, Porto, Motorola e Snapdragon (Qualcomm)
Instagram: 1,2 milhão de seguidores
Depois de uma década sem um brasileiro fixo na Fórmula 1, Gabriel Bortoleto, 20 anos, chega ao grid em 2025 pela Sauber, que em 2026 será a Audi F1 Team. Sua trajetória nas categorias de base foi sólida, com títulos na F3 e na F2, ambos como estreante. Porém, diferente de Senna ou até mesmo de Barrichello — que despertavam expectativas de campeonato mundial desde cedo —, Bortoleto ainda é uma incógnita.
“Ele está em fase de avaliação. Seu ingresso na F1 é um marco, mas o mercado aguarda performance”, diz Corch. Mesmo assim, já tem contratos com Porto, Nestlé e PicPay, sinalizando que há aposta em seu crescimento.
Ubiratan Leal é cauteloso: “Não se fala nele como futuro campeão, mas sua presença já é importante. Voltar a ter um piloto na Fórmula 1, sobretudo se ele começar a andar mais na frente, brigar por pontos, por pódio, vai chamar a atenção do pessoal. Brasileiro gosta de automobilismo por natureza”. Se conseguir bons resultados, Bortoleto pode ser a ponte para uma nova geração de fãs – e patrocinadores.
Júlia Soares: a ginasta que espera sua vez
Esporte Clube Pinheiros
Patrocinadores: Medley, Neutrox, Marilan e Quaker
Instagram: 2,5 milhões de seguidores
Enquanto Rebeca Andrade domina o cenário da ginástica brasileira, Júlia Soares, 19 anos, trabalha nos bastidores para se tornar a próxima estrela. Dona da manobra “Soares”, que utiliza para subir na trave e começar as séries, e medalhista em etapas da Copa do Mundo, ela carrega o desafio de um esporte que, no Brasil, ainda depende de feitos individuais para ganhar holofotes.
“É uma promessa real e carrega um potencial mercadológico importante a médio e longo prazo — principalmente em um cenário pós-Rebeca”, avalia Corch. “Com talento, carisma e consistência, pode construir uma imagem sólida e valiosa ao longo do tempo.” Para Leal, o Brasil virou potência na ginástica, e Júlia pode dar continuidade a isso.
Seu caminho mercadológico depende de consistência e timing. Hoje, ela tem mais que o dobro de seguidores de Bortoleto e Fonseca no Instagram e é patrocinada pela Paper Excellence Brasil. Com carisma e talento, pode seguir os passos (e saltos) de Daiane e Rebeca — desde que consiga escrever sua própria história.