Marcelo Okamura, diretor-presidente do Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV)
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Estamos em um momento decisivo para a gestão sustentável de recursos. A forma como lidamos com produtos ao longo de todo o seu ciclo de vida — especialmente na logística reversa, na reinserção de materiais na cadeia e no uso eficiente dos recursos — deixou de ser um tema restrito à agenda ambiental. Hoje, influencia decisões estratégicas, investimentos, acordos comerciais e a própria competitividade global.
No agronegócio, essa transformação é ainda mais evidente. Um setor historicamente associado à produtividade agora precisa demonstrar como produz, como fecha ciclos, como gere seus resíduos e de que maneira integra inovação à responsabilidade socioambiental. Nesse cenário, o Brasil tem uma oportunidade única: liderar não apenas pela escala da produção, mas pelo exemplo de circularidade e logística reversa já consolidadas no país.
Empresas e instituições buscam modelos eficazes para reduzir impactos. O Sistema Campo Limpo, em que o inpEV atua como gestor, é uma solução concreta e madura para essa nova realidade. Em 2024, foram 68,5 mil toneladas de embalagens vazias encaminhadas para destinação ambientalmente adequada, um crescimento de 29% em relação ao ano anterior. Desde 2002, mais de 800 mil toneladas passaram pelo sistema, com 95% dessa quantidade retornando à cadeia por meio da reciclagem. Esses números mostram que o Brasil já pratica, em escala, aquilo que muitos países ainda discutem em teoria.
A discussão global sobre circularidade no agro é clara: não basta devolver embalagens vazias de defensivos agrícolas ao fim da cadeia. É preciso transformar o processo produtivo. Isso significa automatizar processos, prever gargalos e garantir eficiência em cada etapa. O Sistema Campo Limpo tem avançado justamente nessa direção. Hoje, 86 centrais operam com automação e controle inteligente, utilizando etiquetas datamatrix — que registram origem, tipo de material e peso de cada fardo. É inovação que conecta o agro à lógica dos setores mais avançados da indústria, capazes de gerenciar dados em tempo real e tomar decisões com base em evidências.
Essa modernização se reflete também em produtividade. Em 2024, 71 prensas foram automatizadas, aumentando em 20% a eficiência operacional e gerando uma economia de R$ 4,9 milhões, que se converte em mais recursos para manter e evoluir a rede. Não se trata apenas de logística, mas de inteligência operacional.
A prática do frete de retorno, adotada pelo Sistema Campo Limpo, é outro exemplo de como uma solução simples gera impacto ambiental relevante: o caminhão que leva defensivos agrícolas aos canais de distribuição volta carregado de embalagens vazias, diminuindo emissões e aumentando eficiência.
Mas talvez o maior impacto esteja na economia circular que o Sistema Campo Limpo consolidou. O material que sai das propriedades não apenas tem destino adequado, mas retorna à cadeia produtiva como novos artefatos, como a embalagem Ecoplástica® e a tampa Ecocap®, feitas com resina pós-consumo das próprias embalagens vazias e tampas devolvidas. É a lógica que aponta para o futuro da indústria: transformar resíduos em insumos, reduzir o uso de matérias-primas virgens, gerar valor de forma contínua e mostrar que circularidade não é discurso, e sim prática.
Esse movimento posiciona o Brasil como referência global. Países da Ásia e da Europa têm buscado entender o modelo brasileiro, que combina escala, participação de toda a cadeia e resultados mensuráveis. Em um mundo em que consumidores, investidores e grandes compradores internacionais pressionam por boas práticas ESG, o agro que integra inovação, governança e circularidade ganha vantagem competitiva.
A força do Sistema Campo Limpo está na integração dos elos da cadeia agrícola em um propósito comum. A indústria destina corretamente as embalagens vazias, os canais de distribuição orientam a devolução e disponibilizam postos de recebimento, os agricultores realizam a devolução após o uso e o poder público regulamenta e fiscaliza. É uma engrenagem que funciona porque existe uma visão coletiva do que significa responsabilidade compartilhada.
Se o agro brasileiro quer seguir liderando globalmente, precisa continuar ampliando essa lógica. A logística reversa de embalagens vazias que acontece no Sistema Campo Limpo é um laboratório vivo de como o país pode conduzir a transição para sistemas produtivos mais limpos, eficientes e conectados. Quando inovação e consciência caminham juntas, o resultado não é apenas um processo mais sustentável, mas um novo modelo de desenvolvimento.