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entrevista

No ponto!

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No ponto!

Do início, como garçom,à gestão como diretor de operações no Brasil: a trajetória de Cássio  Silva, um dos protagonistas do sucesso da rede de churrascarias Fogo de Chão

“Não temos segredo. Aqui todos sabem fazer tudo. Se for necessário, eu mesmo corto carne”, brada orgulhosamente Cássio Silva, diretor de operações, no Brasil, da rede internacional de churrascarias Fogo de Chão. E quem se atreve a duvidar? Um dos aspectos fascinantes de sua jornada na empresa é a transição da posição inicial, como garçom, a diretor de operações. Sua lealdade às raízes gaúchas, combinada com a capacidade de se adaptar às demandas atuais, proporcionou à empresa uma vantagem distintiva em cada mercado onde se estabeleceu.

Natural de Novo Tiradentes, no Rio Grande do Sul, Silva chegou a São Paulo aos 14 anos, idade em que começou a trabalhar em uma churrascaria na Zona Leste. Função: lavador de pratos. De sorriso amigável e semblante tranquilo, Cássio começou sua jornada no Fogo de Chão em 2002, aos 18 anos, quando foi contratado como garçom. Dali ascendeu a maître e, mais tarde, a gerente de atendimento, até alcançar a posição de gerente geral, em 2007.

Tão intenso quanto a escalada de Cássio Silva no Fogo de Chão é o compasso que marca a expansão da empresa. Mais de quatro décadas após a inauguração da primeira unidade da rede, em Porto Alegre, pelos irmãos e fundadores, Arri e Jair Coser, hoje a rede está presente em 76 cidades, de diferentes países, sobretudo nos Estados Unidos. México, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos integram a lista, que será expandida para Equador, Bolívia, Filipinas, Canadá, Turquia e Paraguai em 2024. No Brasil, a marca mantém oito restaurantes – um em Brasília, três no Rio e quatro na capital paulista.

Em agosto deste ano, a gestora norte-americana Bain Capital adquiriu a rede de churrascarias em acordo fechado com o fundo Rhône Capital.

Nesta entrevista, o diretor de operações compartilha insights sobre a manutenção da autenticidade do churrasco gaúcho nas operações. Ele também ressalta a importância dos colaboradores como o pilar fundamental do Fogo de Chão, revelando como o treinamento intensivo e a seleção cuidadosa de profissionais capacitados têm sido essenciais para a preservação da cultura da empresa. “Somos um time, uma família, uma festa. Estamos prontos para receber os clientes às 11h30.”

THE PRESIDENT - Em que ano você começou a trabalhar no Fogo de Chão?

Cássio Silva Comecei em 2002, aos 18 anos, como garçom, e passei por todos os setores da empresa. Fui promovido a maître, depois a gerente de atendimento e, em 2007, a gerente geral. Em 2011, eu me tornei gerente regional e finalmente diretor de operações, em 2016. Mas meu primeiro emprego foi com 14 anos, lavando pratos, numa churrascaria paulistana que não existe mais. O Fogo de Chão só contratava funcionários maiores de idade.

Como foi seu início no Fogo de Chão?

Todo mundo falava no Fogo de Chão. Era onde eu queria trabalhar. Entrei e fiquei apaixonado por aquele diferencial, de o cliente sair feliz, ter um produto de qualidade, e por estar em um ambiente onde os colaboradores tinham um tratamento, a mesma comida do cliente, plano de saúde maravilhoso, plano de carreira, poder fazer curso, aprender. A gente tem esse treinamento para quem quer oportunidade, ocupar um cargo de liderança, pessoas humildes que vêm do interior, que aprendem de tudo, boas práticas, como ter uma postura para atender o cliente.

Há anos, a empresa vive um momento de expansão internacional. Como vem sendo a adaptação da forma brasileira autêntica de preparar churrasco a outros mercados?

Os nossos restaurantes são grandes. Têm entre 400 e 500 lugares. São muitos os desafios, mas temos conseguido ultrapassá-los com muito esforço e trabalho. Nossa cultura no Rio Grande do Sul é de trabalho, família, desafio. E nós, gaúchos, gostamos de desbravar qualquer lugar do mundo. Você sempre vai encontrar um gaúcho mundo adentro. É a cultura que temos dentro da empresa: a da hospitalidade. Por isso, acredito que o sucesso do Fogo de Chão no mundo, hoje, se dá principalmente pelas pessoas, por nossos colaboradores. A linha de frente é um grande desafio em qualquer restaurante. Temos conseguido, com muito treinamento, contar com os melhores profissionais do mercado.

Qual é a logística desse processo?

Nós mandamos de 40 a 50 profissionais por ano para os Estados Unidos, com green card, para trabalhar lá. É um desafio lógico repor esses colaboradores aqui para poder suprir os EUA. E mais agora, já que vamos abrir nos próximos meses no Equador e na Bolívia, sem contar Filipinas, Canadá, Turquia e Paraguai. Posso garantir que conseguiremos manter a qualidade com mestria.

Fachada do Fogo de Chão da avenida dos Bandeirantes, em São Paulo

Quais são as funções que esses profissionais desempenham quando embarcam para o exterior?

Nos Estados Unidos, são principalmente churrasqueiros e garçons. Os gaúchos saem do Brasil para ensinar nossa cultura de churrasco, de hospitalidade, no mercado norte-americano. Também vão alguns gerentes, para ajudar a abrir nossos restaurantes por lá. E há toda a questão de imigração, com aprovações do consulado, vistos, conforme vamos repondo. As pessoas são o nosso pilar principal.

Como é possível manter o controle de qualidade nessas operações em mercados tão distintos?

No Brasil, temos oito unidades. Então, o controle de qualidade, lógico, passa por mim, pelos gerentes gerais. Temos um setor que cuida exclusivamente de padrão, de compras, para manter a qualidade do produto. Investimos pelo menos quatro horas por semana só em treinamento. A cozinha tem um treinamento específico, mais de produção, de mão na massa. E temos treinamento para líderes, multiplicação de conhecimento.

Quando o Fogo de Chão chega a um novo mercado, qual é o desafio de implantação?

Abrir um restaurante novo já é um desafio. Você tem que estar lá, com a equipe treinando por dois meses. É como um time de futebol. Você faz a seleção, ninguém se conhece, será a primeira seleção com jogadores diferentes. Temos esse programa, com equipes de abertura de restaurantes, que vão na frente, limpando o caminho para colocar o restaurante em ordem, recebendo mobília, mercadoria. Quase um mês ali, fazendo a preparação, testes de equipamentos, como churrasqueira, fogão e outras coisas, treinando as equipes e colocando o time para se entrosar. São em torno de 20 pessoas, entre gerente, diretor, chefe de cozinha, as pessoas qualificadas, já preparadas para dar o treinamento para o restaurante abrir com perfeição.

Como você acompanha a evolução das tendências gastronômicas para implantá-las no dia a dia?

Fico muito atento às inovações, principalmente ao nosso principal produto, que é a carne, o churrasco. Há logicamente alguns cortes novos, mas costumo brincar, dizendo que o boi tem limites. Não dá para inventar tanta coisa: tem aqueles cortes ali e não vão surgir outros. Por exemplo, nós não usamos a entranha, que no Uruguai é muito usada. A entranha é retirada da parte interna da costela. Recentemente introduzimos o Dry Aged nas unidades. Nesse método especial, as carnes selecionadas, como T-Bone e Tomahawk, ficam armazenadas em um locker e passam pelo processo de maturação a seco, mantendo temperatura e umidade controladas durante 32 dias. Esses cortes maturados são verdadeiras iguarias, pois ganham um adicional de sabor e suculência, além de textura amanteigada. São um verdadeiro convite aos clientes do Fogo de Chão. Agora, a nossa mesa de saladas tem um pouco de tudo o que é mais conhecido nos principais países. Em 2006, fiz uma viagem e conheci uma sementinha chamada quinoa. Quando voltei, comentei com meu chefe e implantamos a quinoa no nosso bufê.

O que mais você destacaria no bufê?

É uma combinação de cores, sabores, um pedacinho de cada parte do mundo. Jamón Serrano, espanhol, queijo brie, francês, aspargos peruanos, parmesão italiano. Estamos bem cobertos. Nossa inovação acontece conforme as estações, da salada de pinhão ao caldinho de feijão e abóbora. Há 15 dias, introduzimos uma salada de arroz negro com legumes grelhados e uma abóbora cabotia. Adaptamos a salada de batata tradicional com ovos, legumes. Um fator que faz o Fogo de Chão ainda mais atrativo é o seu bufê completo, principalmente suas saladas. O tartar de beterraba também se destaca como uma novidade. Já os fãs de pratos árabes ficarão encantados com a adição do homus, uma pasta feita à base de grão-de-bico, que é muito versátil. As novas combinações de couve com romã e maçã assada com abóbora dão ainda mais um toque de frescor às opções.

A picanha continua sendo o corte favorito entre os brasileiros, e lá fora?

Sim. E lá o nome da carne também é picanha. Mas os cortes preferidos, quando chegamos aos Estados Unidos, eram o ribeye, o bife ancho, a costeleta de cordeiro e o filé-mignon. Fomos ensinando e apresentando nossos cortes diferentes. 



Como você equilibra a vida pessoal e a profissional?

Não é difícil. Tenho uma rotina, lógico, com compromissos. Atendemos às demandas do nosso escritório central, em São Paulo. Chego cedo ao restaurante, vejo se está tudo ok. Você tem que produzir e tudo tem que estar perfeito para receber os clientes. Se não estou presencialmente, estou ao telefone. Mas também arrumo tempo para o lazer, folgar, tirar férias. O time não depende só de mim. Há muita gente competente nos restaurantes. Quando o gerente folga, tem o gerente de atendimento para tocar a operação sem problema algum.

Algum método em especial para esse alinhamento?

Muita gente pergunta qual é o segredo. Mas não há: todo mundo sabe fazer tudo. Nossas receitas não têm segredo. Não temos apenas um churrasqueiro, mas 18 ou 20 chefs churrasqueiros. Então não depende só dele, só do caixa, ou só do presidente. Somos uma equipe muito grande. Na semana passada, no Rio de Janeiro, ajudei os gaúchos a cortar carne, a espetar. Somos um time, uma família. É como uma festa, um encontro, e temos que estar prontos para receber os clientes às 11h30.

A que hora você chega ao escritório?

Isso muda muito, mas geralmente chego cedo e vou embora tarde. Às vezes, chego às 7h30 (ou às 7 quando tem o rodízio de carros). Gosto de estar com o time em todos os horários. E de ser o último a sair também, à meia-noite, 1 hora, porque gosto de ver como estamos fazendo o fechamento das lojas. Se há algum erro, é nesse momento que precisamos consertar. Viajo semana sim, semana não. Vou ao Rio de Janeiro, fico três, quatro dias. Vou para Brasília, fico três dias, volto. E duas vezes por ano vou aos EUA. Temos um encontro anual, que reúne toda a liderança e, mais uma vez por ano, uma reunião para gerentes de país e diretores.

O fato de você trabalhar no Fogo de Chão, ainda que em uma função administrativa, gera muitos pedidos de dicas no dia a dia para preparar um bom churrasco?

Com certeza. Até mesmo os clientes têm essa curiosidade. Muitos moram em apartamento e não têm churrasqueira, nem o costume de fazer o churrasco, principalmente o gaúcho, como fazemos no sul. Pedem dicas de como preparar a costela. É todo o tempo, principalmente se o pessoal está em família. Há sempre essa curiosidade.

E você entrega os segredos prontamente?

Com certeza! (risos) Explico até a preparar a marinada. Em relação à costela, é uma peça grande, de 3,5 ou 4 kg. Uma parte do boi um pouquinho mais dura, com mais gordura, mais firme, que demora um pouco mais para preparar. Ela requer quatro horas, 4,5 horas, dependendo da espessura. Mas é uma carne extremamente saborosa porque a gordura dá a explosão de sabor. Com o tempo adequado, ela fica macia. Ou seja, predomina a maciez. Mas é a gordura que traz a explosão de sabor.

Como quem não tem churrasqueira ou grelha em casa pode preparar no forno?

Não precisa de tempero. O principal é o sal, mas tem gente que gosta de jogar alguns temperos. Tem que levar ao forno, deixar assando por quatro horas a 180 ou 200 graus. Depois de quatro horas, pode ter certeza de que a costela estará desmanchando. Sabe quando o osso se solta, com a gordura derretendo lentamente, amaciando a carne?

Você, gaúcho, já admite que se tempere a carne do churrasco com outros temperos, além do sal grosso?

Acho que hoje mudou bastante. Antigamente, no interior, não havia muito esses temperos, essa moda atual. Era só sal grosso mesmo. Hoje, no mundo globalizado, tem-se um pouco de tudo. Até no Rio Grande do Sul o pessoal vai mudando. Mas eu, como bom churrasqueiro, indico que o sal grosso basta para fazer uma costela.

Qual vinho você recomenda para acompanhar um bom corte de carne?

O Malbec, encorpado, mais alcoólico, acompanha muito bem um churrasco suculento, por causa da gordura. É, aliás, o vinho mais vendido nos nossos restaurantes.